Atualmente, temos visto diversos atletas de elite aderindo a um padrão alimentar vegetariano. A alimentação à base de vegetais é um interesse de muitos, mas com tantos mitos, as pessoas ainda ficam preocupadas com uma possível limitação no desempenho físico.
A verdade é que uma dieta vegetariana, ou mesmo vegana, não parece prejudicar a performance no esporte (1,2), mas devemos ter alguns cuidados! Nesse texto, eu vou te ensinar tudo que você precisa saber para adequar a sua alimentação e garantir os melhores resultados na prática esportiva.
O que pode limitar o desempenho físico de um vegetariano?
Em linhas gerais, os fatores que podem limitar o desempenho de um atleta vegetariano são a oferta calórica diária, o consumo de proteína, ômega 3, creatina, carnosina, vitamina B12, vitamina D, ferro e cálcio (3), vamos falar de cada um deles?
Calorias
Uma oferta calórica adequada é fundamental para qualquer atleta. A necessidade energética de um indivíduo fisicamente ativo tende a ser bem alta, e quando não adequada pode levar a um maior risco de lesão, quedas na imunidade e perda de massa muscular.
Os alimentos de origem animal contribuem de forma importante para a oferta calórica de um atleta, compreendendo na média cerca de 43% das calorias ingeridas em um dia (4,5). Além disso, os alimentos vegetais têm uma menor densidade calórica e são naturalmente ricos em fibras que causam saciedade.
Por essas razões, garantir a oferta calórica diária de um atleta com uma dieta à base de vegetais pode ser um pouco mais difícil, mas não necessariamente limitante. Estudos de fato reportam que vegetarianos consomem menos calorias que onívoros (5), então vale ter uma atenção especial, preferindo alimentos vegetais que são mais densos em calorias, como batatas e massas.
Proteína
É natural que o consumo de proteína fique um tanto mais baixo quando aderimos um padrão alimentar vegetariano, afinal os alimentos de origem animal representam as principais fontes desse macronutriente.
Atividades esportivas geralmente levam à degradação de tecido muscular e, consequentemente, a uma maior demanda de proteína. A necessidade diária desse nutriente fica na faixa de 0.8g por kg de peso, mas atletas precisam de muito mais! O consenso é que algo na faixa de 1.6g de proteína por kg de peso parece ser uma quantidade adequada para a maioria dos esportistas, podendo chegar até 2.2g/kg em alguns casos (6,7).
Os alimentos de origem vegetal apresentam um menor teor de proteína, além disso, as proteínas vegetais têm um menor teor de aminoácidos essenciais e uma menor biodisponibilidade. Apesar disso, estudos que comparam proteínas vegetais com animais observam que, a partir de 1.6g por kg de peso, os resultados são os mesmos, independente da proteína ser de origem animal ou vegetal (8).
Sem dúvida, a proteína é uma preocupação para atletas vegetarianos; por isso, é importante adequar esse nutriente consumindo alimentos vegetais ricos em proteína ou usando suplementos concentrados.
Ômega 3
O ômega 3 é uma gordura polinsaturada com propriedades anti-inflamatórias. É um nutriente essencial encontrado predominantemente em peixes e frutos-do-mar, mas existem fontes vegetais de ômega 3 como chia, linhaça e nozes.
Devido à sua capacidade de controlar processos infamatórios, acredita-se que o ômega 3 pode contribuir para o desempenho de atletas que lidam constantemente com inflamação, porém estudos não observam qualquer benefício na performance esportiva a partir da suplementação com esse nutriente (9).
De qualquer forma, é valido ter uma atenção especial com o ômega 3 em atletas vegetarianos, incluindo fontes vegetais na dieta ou fazendo a suplementação com óleos ricos nesse composto. Quer saber mais sobre o ômega 3? Clique aqui!
Creatina e carnosina
A creatina e a carnosina são elementos nutricionais encontrados predominantemente em alimentos de origem animal. Ambos são importantes para o desempenho esportivo, especialmente a creatina, que tem impactos bem significativos.
Estudos observam que vegetarianos, principalmente veganos, têm reduções nos níveis intramusculares de creatina e carnosina (10,11), representando uma possível limitação no esporte. A boa notícia é que ambos podem ser corridos facilmente, suplementando creatina e beta-alanina (que é percursor da carnosina). Clique aqui para saber mais!
Vitamina B12 e vitamina D
A vitamina B12 é um nutriente essencial que fica limitado em uma dieta à base de vegetais, já que encontramos quantidades satisfatórias somente em alimentos de origem animal. Atletas, em especial, devem ter uma atenção com a vitamina B12 visto o seu papel no metabolismo energético, por isso o recomendado é sempre suplementar. Saiba mais clicando aqui!
A vitamina D é uma vitamina lipossolúvel encontrada em diversos alimentos de origem animal, como carne, peixe, queijos e ovos, e em alguns alimentos de origem vegetal, como cogumelos e levedura nutricional (12). Também conseguimos ter suficiência dessa vitamina através da exposição solar.
Estudos reportam que os níveis séricos de vitamina D parecem ser mais baixos em vegetarianos (13,14); por isso, vale a pena ter uma atenção redobrada nesse público, principalmente em atletas, já que a vitamina D atua na saúde dos nossos ossos.
Ferro e cálcio
O ferro é essencial para a formação de células plasmáticas que carregam oxigênio e de enzimas mitocondriais fundamentais na produção de energia. Embora vegetarianos tenham um consumo mais elevado de ferro, há uma tendência a apresentarem baixos níveis do mineral, visto a menor biodisponibilidade do ferro de origem vegetal (15,16).
Atletas têm uma maior perda de ferro por consequência do fluxo turbulento de sangue que leva a hemólise (perda de células vermelhas no sangue), além de terem uma maior demanda energética. Mulheres jovens são especialmente susceptíveis a deficiência de ferro e devem ter atenção com uma dieta vegetariana.
Por outro lado, o excesso de ferro pode ser prejudicial para a nossa saúde, já que é um mineral extremante tóxico. Homens, mesmo em uma dieta vegana, tendem a apresentar suficiência de ferro, já mulheres podem precisar da suplementação, mas isso deve ser feito com acompanhamento de um profissional.
O cálcio é um mineral fundamental para a formação dos nossos ossos, mas que também atua na contração muscular. Em geral, as fontes vegetais de cálcio parecem ser suficientes em suprir a necessidade de um atleta, mas isso requer uma orientação dietética detalhada.
A suplementação com cálcio geralmente é desnecessária em vegetarianos, mas mulheres atletas são um público de risco. Estudos apontam que no sexo feminino a suplementação com cálcio pode ser desejável na tentativa de atingir 1.500mg/dia, valor que corrige qualquer risco de deficiência nesse público (17).
Conclusões e dicas:
Nesse texto, eu espero ter te ajudado a corrigir algumas das principais limitações para um atleta vegetariano. Apesar dessas "limitações", vegetarianos também têm várias vantagens, como um maior consumo de fitoquímicos com propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias, melhoras na viscosidade do sangue e uma maior facilidade para manter um baixo peso, fatores que favorecem o desempenho no esporte!
O fato é que é possível ter um desempenho esportivo satisfatório com uma dieta vegetariana, e com essas adequações, provavelmente superior devido a todas as questões que citei acima!
Dicas:
Se você é um atleta vegetariano, garanta um aporte calórico adequado, preferindo alimentos vegetais que são mais densos em termos de calorias;
Consuma alimentos vegetais ricos em proteína, como feijão, lentilha, grão-de-bico e derivados da soja;
Considere a suplementação com proteína;
Inclua fontes vegetais de ômega 3 na sua dieta;
Considere a suplementação com ômega 3;
Suplemente creatina e beta-alanina para ter os melhores resultados;
Tenha atenção com a vitamina B12 e D;
Se você é uma mulher atleta, considere a suplementação com ferro e cálcio;
Na dúvida, busque um nutricionista para te ajudar.
Conteúdo por: Cláudio Bender | Nutricionista | CRN: 17268
Referências:
1.Lynch, H. M., Wharton, C. M., & Johnston, C. S. (2016). Cardiorespiratory fitness and peak torque differences between vegetarian and omnivore endurance athletes: a cross-sectional study. Nutrients, 8(11), 726.
2. Barnard, N. D., Goldman, D. M., Loomis, J. F., Kahleova, H., Levin, S. M., Neabore, S., & Batts, T. C. (2019). Plant-based diets for cardiovascular safety and performance in endurance sports. Nutrients, 11(1), 130.
3. West, S., Monteyne, A. J., van der Heijden, I., Stephens, F. B., & Wall, B. T. (2023). Nutritional considerations for the vegan athlete. Advances in Nutrition.
4. Bradbury, K. E., Tong, T. Y., & Key, T. J. (2017). Dietary intake of high-protein foods and other major foods in meat-eaters, poultry-eaters, fish-eaters, vegetarians, and vegans in UK Biobank. Nutrients, 9(12), 1317.
5. Clarys, P., Deliens, T., Huybrechts, I., Deriemaeker, P., Vanaelst, B., De Keyzer, W., ... & Mullie, P. (2014). Comparison of nutritional quality of the vegan, vegetarian, semi-vegetarian, pesco-vegetarian and omnivorous diet. Nutrients, 6(3), 1318-1332.
6. Morton, R. W., Murphy, K. T., McKellar, S. R., Schoenfeld, B. J., Henselmans, M., Helms, E., ... & Phillips, S. M. (2018). A systematic review, meta-analysis and meta-regression of the effect of protein supplementation on resistance training-induced gains in muscle mass and strength in healthy adults. British journal of sports medicine, 52(6), 376-384.
7. Chapman, S., Chung, H. C., Rawcliffe, A. J., Izard, R., Smith, L., & Roberts, J. D. (2021). Does protein supplementation support adaptations to arduous concurrent exercise training? A systematic review and meta-analysis with military based applications. Nutrients, 13(5), 1416.
8. Hevia-Larraín, V., Gualano, B., Longobardi, I., Gil, S., Fernandes, A. L., Costa, L. A., ... & Roschel, H. (2021). High-protein plant-based diet versus a protein-matched omnivorous diet to support resistance training adaptations: a comparison between habitual vegans and omnivores. Sports Medicine, 51, 1317-1330.
9. Hingley, L., Macartney, M. J., Brown, M. A., McLennan, P. L., & Peoples, G. E. (2017). DHA-rich fish oil increases the omega-3 index and lowers the oxygen cost of physiologically stressful cycling in trained individuals. International journal of sport nutrition and exercise metabolism, 27(4), 335-343.
10. Burke, D. G., Chilberk, P. D., Parise, G. I. A. N. N. I., Candow, D. G., Mahoney, D., & Tarnopolsky, M. (2003). Effect of creatine and weight training on muscle creatine and performance in vegetarians. Medicine & Science in Sports & Exercise, 35(11), 1946-1955.
11. Everaert, I., Mooyaart, A., Baguet, A., Zutinic, A., Baelde, H., Achten, E., ... & Derave, W. (2011). Vegetarianism, female gender and increasing age, but not CNDP1 genotype, are associated with reduced muscle carnosine levels in humans. Amino acids, 40(4), 1221-1229.
12. Roseland, J. M., Phillips, K. M., Patterson, K. Y., Pehrsson, P. R., & Taylor, C. L. (2018). Vitamin D in foods: an evolution of knowledge. In Vitamin D (pp. 41-77). Academic Press.
13. Crowe, F. L., Steur, M., Allen, N. E., Appleby, P. N., Travis, R. C., & Key, T. J. (2011). Plasma concentrations of 25-hydroxyvitamin D in meat eaters, fish eaters, vegetarians and vegans: results from the EPIC–Oxford study. Public health nutrition, 14(2), 340-346.
14. Hansen, T. H., Madsen, M. T., Jørgensen, N. R., Cohen, A. S., Hansen, T., Vestergaard, H., ... & Allin, K. H. (2018). Bone turnover, calcium homeostasis, and vitamin D status in Danish vegans. European journal of clinical nutrition, 72(7), 1046-1054.
15. Haider, L. M., Schwingshackl, L., Hoffmann, G., & Ekmekcioglu, C. (2018). The effect of vegetarian diets on iron status in adults: A systematic review and meta-analysis. Critical Reviews in Food Science and Nutrition, 58(8), 1359-1374.
16. Neufingerl, N., & Eilander, A. (2022). Nutrient intake and status in adults consuming plant-based diets compared to meat-eaters: A systematic review. Nutrients, 14(1), 29.
17. Sims, S. T., Kerksick, C. M., Smith-Ryan, A. E., Janse de Jonge, X. A., Hirsch, K. R., Arent, S. M., ... & Antonio, J. (2023). International society of sports nutrition position stand: nutritional concerns of the female athlete. Journal of the International Society of Sports Nutrition, 20(1), 2204066.
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